Acho que foi aí que começaram minhas dificuldades
de comunicação com as pessoas. Sempre tive essa sensação de que, pra ser
compreendida, preciso buscar as palavras exatas e as frases mais bem formuladas
(ou os melhores desenhos), senão elas não vão me entender. Percebo que muita
gente não presta atenção no que os outros estão falando. Isso comigo acontece o
tempo todo: estou dizendo uma coisa e a pessoa está viajando pelo espaço
sideral, conectada a outro tempo, olhando o trânsito. Eu sempre fico meio atônita
(e muito, muito frustrada) quando não sou compreendida, ou, pior, quando sou
interpretada da maneira errada. É sempre um susto, um soco no estômago.
Talvez daí também tenha surgido minha necessidade
de escrever. Escrevendo, posso organizar melhor as palavras e os pensamentos,
tenho o tempo de pinçar os melhores substantivos, adjetivos, de construir as
melhores frases. As palavras são tão lindas e saborosas!
Etéreo. Pra ser falado sussurrando bem baixinho: “etéééreo!”
Não é lindo? Delicado. De-li-ca-do. Cuidado pra não quebrar ao
falar. Kkkkkk Estou viajando. A-le-sa-da. Lembrei agora do nome de Lolita
estalando na boca de Humbert Humbert logo no primeiro parágrafo do livro. Que
delícia!
Mas é assim: escrever pra ser compreendida, pra expressar, pra existir
no mundo. Escrever porque é gostoso, e pronto. Isso nem sempre adianta, porque
sempre tem aquelas criaturas de coração de pedra que acham tudo uma grande
frescura: “escrever não enche bucho!”. Juro que já ouvi isso. Pode até não
encher o bucho, mas enche minha mente de felicidade. Flocos de algodão voando
na cachola, fazendo cosquinha. Djilícia!
E ler? Ler vem antes. Ler é escrever ao contrário,
de fora pra dentro. As palavras entram na nossa mente e ficam ali, tatuadas,
dançando, dando cria. É como viver várias vidas simultaneamente. É um
"Quero ser John Malkovitch" ainda mais viajado. A gente vê o mundo
pelos olhos de outras pessoas.
E o que melhor do que escrever sobre o que se lê, o
que se ouve e o que se vê? Por isso o Porto Solar, grupo de leitura que existe
no mundo real, se juntou também aqui, no mundo virtual. Acho que falo por todos do
grupo quando digo que queremos compartilhar com os amigos a nossa paixão pelos
livros, pelos filmes, pelas coisas boas, bonitas e interessantes que vemos no
mundo.
Sempre relacionei fotos de perfil com identificação criminal e a posição que devo evitar para tirar fotos. Enquanto isso, Holandinha ensaiava perfis nos desenhos de infância, né? Gênia! Mas, vendo agora o desenho de Picasso e lendo a sua historinha, penso eu que ele também deve ter sido indagado dessa mesma forma e por isso tentou o perfil de dois ângulos. Não entenderam, ele teve que desenhar. Engraçado que é comum ouvir isso do "entendeu ou quer que eu desenhe?" como se um desenho fosse mais palpável que a palavra falada ou escrita. Lembrei então de quando eu era ainda adolescente, quase adulta, e um paquera tentou dizer que me amava. Não era suficiente usar palavras diretas e objetivas, porque, na minha timidez e insegurança, eu não queria ouvir algo tão preciso. Ele então desenhou nossas iniciais em torno de um coração, sem técnica nenhuma, e então foi mais fácil aceitar aquele amor(desenhado). Talvez o desenho livre, por isso, seja mais sincero que a escrita. Na escrita, a gente se preocupa muito mais em encaixar as palavras à métrica,à rima e ao ritmo do que aos próprios sentimentos. Escrever é muito mais amor à própria palavra e suas infinitas possibilidades, que amor propriamente dito. Bem, e a leitura é o alimento desse amor. Ler vem antes, como tu bem falou. Ai lembro de Raul na música "Eu também vou reclamar", que assim diz:
ResponderExcluirOlhos os livros
Na minha estante
Que nada dizem
De importante
Servem só prá quem
Não sabe ler"
Pois é! Ler também vem antes de reclamar rsrs